Faltam 8 dias. O afeto que nos tomou criou um novo clima, um
novo ambiente, como uma redoma de vidro. Tinha criado um universo paralelo, que
nos acolhia tão maravilhosamente e nos fazia os únicos habitantes daquela
realidade. A manhã que se seguiu à nossa noite de amor foi bem menos estranha
do que eu temi. Como de costume, ela acordou antes de mim, já tinha se trocado
e saía para a sala do café. Quando me despertei fiz questão de não avisá-la.
Esperei que deixasse o quarto, assim teria mais tempo para pensar nas
possibilidades que nosso primeiro encontro após o acontecido teriam.
E se ela
tivesse se arrependido? Se não tivesse passado de um momento, apenas? Será que
ela teria vergonha de me olhar? Eu sem dúvida tinha. Nunca havia lidado com
essa situação pós-transa, não sei como devia agir e muito menos como ela
reagiria. Continuei deitado, naquela morbidez matinal, esperando que uma ideia
caísse dos céus, ou de qualquer outro lugar. Clarice chegou antes da ideia, sem
chegar a uma decisão, voltei a fingir que dormia. Diferentemente dos outros
dias, ela veio me acordar. Senti sua presença, de leve, avançando pela cama.
Segundos depois ela me deu beijo, que acompanhava um gemido me pedindo para
acordar.
- Bom dia! – Ela falou quando abri meus olhos, bem devagar
para não destoar e denunciar minha encenação
- Bom dia, tudo bem? -
Respondi com naturalidade, sugerindo que nada tivesse acontecido.
- Tudo, e aí, dormiu bem?
- Dormi.
- Nossa, como assim, dormi? Só? Nem parece que...
- Ué, não. Dormi muito bem mesmo, é que ainda tô meio
sonolento – menti.
- Hum...esperava que você acordasse mais feliz, sei lá. Eu
acordei...
- Eu também, Clari. Desculpa, vem cá – falei abrindo os
braços na esperança que ela se acolhesse entre eles.
- Ah, tá! – exclamou mais animada, respondendo ao meu gesto.
– Clari? Nunca haviam me chamado assim – soltou uma risada – gostei. Vem aqui
comigo. – me puxou da cama, sem ao menos me dar tempo de vestir melhor. Pegou
na sua bolsa a carteira de cigarros, que eu nem lembrava que existia, e acho
que ela também não, já que durante todo esse tempo não senti cheiro de fumaça
ou nicotina nela.
- Já fumou? –
perguntou.
- Não.
- Sério?
- Aham
- Então fuma um desses comigo, só pra relaxar.
- Ah. Não. Acho que não faz meu tipo isso aí...deixa pra lá.
- Só um! Eu quase nunca fumo, muito as vezes. Você nunca
ouviu falar que depois de...
- Já! Que é costume, né? Mas não levo a sério...
- Eu também não, mas...Ah vai logo – foi me empurrando um,
enquanto tentava acendê-lo. – É só não puxar muito forte, deixa o fumo queimar
naturalmente, devagarzinho... – Explicou colocando o cigarro na minha boca.
Senti novamente o gosto amargo da nicotina, que obviamente não contaria a ela
que já tinha conhecido naquela circunstância ridícula. Segui o que ela falou,
não traguei e deixei a fumaça, aos poucos, entrar em minha boca. Para minha
supresa não me engasguei de novo, nem senti ânsia de vômito. Suportei aquilo, e
me senti aliviado por não passar mais uma vergonha na frente dela.
- Viu? É Tranquilo...
- É – concordei baforando uma nuvem de fumaça. – Ficamos mais
algum tempo por ali, ela pegou um e me acompanhou. Terminamos de fumar, tomei
um banho e nos preparamos para sair mais uma vez. Os dias iam se passando, a
viagem ia acabando e tínhamos mais alguns lugares para aproveitar.